
POR QUE
NO
PAR QUE?
f.n.
Certas coisas só acontecem comigo mesmo.
Andava à espreita de umas cores que pintassem a luz do dia
(à luz do dia nada pinta)
quando dei por mim analisando as pernas
da menina que vendia sorvete atrás da barraquinha.
Puro gelo. Só mesmo comigo.
Bateu um vento,
mas já não tinha nada a ver com as pernas e a sainha,
e eu ali, de olho na tarde que se esvaía.
Gelo puro? – disse eu,
porque se há coisa que um homem faz
quando vê uma mulher que lhe interessa
é puxar conversa.
O vermelho é groselha;
amarelo, maracujá.
Era até capaz de jurar,
há quantos anos não te via
assim tão bela, expressiva...
Quer fazer umas fotos? Um book?
Só pra vê-la sorrir e duvidar, dali pra frente,
de tudo que eu dissesse, se fingindo indiferente.
Velha essa, né?
É provável uma certa alegria
ao me ouvir contar
que andava atrás de umas cores
pra pintar a luz do dia.
Quando puxei a carteira e paguei,
lá estava de novo o sorriso,
mas não me parecia falsa, a desprezível interesseira...
não nessa hora.
Virei as costas
e a ouvi dizer, baixinho para a amiga:
homem é tudo igual, só quer saber de cantar a gente...
Esse, nem dinheiro tem.
Não queria nada
nem mesmo comigo só...