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Ok?

sexta-feira, 13 de março de 2009

Abel e Caim

Era um homem comum, com um grande sonho na vida:
ser o mais comum dos mortais.
Até aí tudo bem.
Nada demais?
Engano seu. Seria como tantos e tantos outros,
a não ser por uma pequenina diferença:
o que seu olho direito via
nunca era igual ao que o esquerdo enxergava.
E como os "olhos são a janela da alma"
(não me lembro se foi um filósofo ou um oculista quem o disse),
o pobre não tinha sossego.
O olho direito vislumbrava um belo dia,
era o bastante para o esquerdo
prever chuvas e trovoadas no período.
Se um piscava para o corpo feminino; o outro lancetava-lhe a alma.
(Não há mulher que resista à dupla afronta).
Problemas, havia no trânsito:
sinal verde para um; vermelho para outro
(O que seria do Detran se todos gostassem do amarelo?)
Era assim no trabalho:
se um via o chefe alegre, o outro irritava a secretária.
Em casa acontecia o mesmo;
na rua, com os amigos...
De tamanha hesitação, sem saber o que vinha pela frente,
começou a colecionar inimigos.
E foi um deles seu douto inquisidor:
interroga daqui, investiga de lá...
e surge a sentença: arranca, expurga, anula
- um deles, terás de escolher.
Se ficas com o direito, vaza o esquerdo;
se queres o esquerdo, mergulha em ácido o direito.
Era a infalível receita da comunidade.
O pobre homem insurgiu-se, rebelou-se.
Queria ser comum como todos,
mas precisava ouvi-los antes de decidir.
Mais uma vez, onde o olho esquerdo viu sabedoria,
o direito apontou ignomínia.
Onde o esquerdo enxergou virtude,
o direito espicaçou a covardia.
E eis que novamente hesitou:
nascera com os dois, com os dois ia terminar.
Quedaram-se unidos o direito e o esquerdo olho.
Incomuns, imortais, antagônicos,
enclausurados nesse ver-e-não-ver.
Para desespero do pobre homem,
detentor de tão raros e incômodos tesouros.


fn

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