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domingo, 18 de julho de 2010

Vagas Luzes - III





As coisas funcionam mais ou menos assim: ninguém te conhece, talvez só uns poucos, que não mandam em nada. De repente, da noite pro dia, começam a falar de você, elogiam algo que você fez, dizem que aquilo foi incrível, que ninguém tinha feito nada parecido. Mais um tempo e a coisa se espalha, vira moda, todo mundo diz que te conhece, gente que você nunca viu na vida te acha o máximo. Isso vai crescendo, sem que você precise fazer coisa alguma. Quem te elogia não sabe dizer por quê, não sabe o que você fez ou deixou de fazer, se foi valente ao extremo ou esperto como poucos. Não tem a menor importância descobrir qual foi o seu papel nessa, digamos, vertiginosa ascensão, tanto faz se você andou dando uns telefonemas, se encontrou com algumas pessoas influentes, nada, mas nada mesmo, pode explicar a razão de um sucesso tão retumbante e tão inesperado. Agora, pense bem: você "explodiu", na sua área, é claro, Tem todo o direito de pensar em se converter numa autêntica celebridade, no seu país, no continente, no mundo, por que não? Você fica ali em cima, lá no alto mesmo, pensando nisso durante um tempo, gozando a vitória, antegozando o pleno sucesso, que certamente virá. Virá? De repente, mais uma vez "de repente", assim como você começou a subir no conceito das pessoas, sem mais nem menos, começa a cair. Daí em diante, se alguém falar no seu nome, será, talvez, ignorado, quem sabe, ridicularizado com zombarias ou, pior ainda, com as agulhadas do silêncio. Subiu rápido? Descerá voando. A queda é vertiginosa. Só então você vai tentar entender e explicar para si mesmo, Virgílio, o que foi que aconteceu com seu prestígio? Depois irá repetir milhares de vezes, com ou sem plateia, a mesma história do sucesso um dia alcançado, sem perceber que a maioria já nem se lembra mais, alguns até pensam que é pura invenção da sua cabeça torta. E você? Vai viver de lembranças? Ou vai refazer o caminho percorrido? Não há como escapar da dupla armadilha.
Quando sua mãe lhe dizia, por que você tem que se meter com gente dessa laia, Virgílio?, e você se limitava a disfarçar, laia, que laia, mãe?, e pensava que ela, como toda boa mãe, queria que você abandonasse o caminho do crime e se tornasse, digamos, um cidadão honesto, mas não era nada disso, não havia um caminho do bem contra um caminho do mal, nunca houve, balela, o conselho era pra você não se ligar ao submundo, passar por cima das pequenas formigas carregadeiras e entrar para o grand monde, entrar para o clube dos poderosos, aqueles que ninguém pega, não pegarão jamais, nem aqui nem no Cazaquistão, entendeu? Era pra você ganhar a confiança de alguns que mandam nos que acham que mandam, para depois se tornar um deles, os que mandam em tudo e em todos, era só isso que a sua mãe queria, Virgílio, foi o que sonhou para você, político, empresário das altas rodas, milionário, criminoso?, não se fala assim de gente poderosa, pessoas de bem, mas você não a obedeceu, nunca fez o que ela pediu e acabou aí desse jeito, enganado, abandonado, até por aqueles que se diziam seus melhores amigos, pior, tudo isso serviu apenas para testar o que eles chamam de projeto piloto, o tal que pretende introduzir a novíssima profissão, nem preciso te explicar mais nada, você já sabe a que me refiro. Se vão ou não vão te socorrer, pouco importa. Talvez você pague o pato, condenado por um crime que não cometeu, talvez você saia ileso de mais essa armadilha. Pouco importa, como já disse. O que interessa, amigo Virgílio, é que você está nas mãos da ralé, preso por compromissos materiais e imorais, provavelmente, quem manda em quem não manda não vai interferir. Seu destino é esse, há muito está traçado.

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