
ZARATUSTRA
NOVES FORA
NIETZSCHE
Fn
Imagina que não tens ninguém,
nenhuma pessoa sequer no mundo, falando bem ou mal de ti.
És um ilustre desconhecido, vagando por uma terra estranha.
Pensa também que não possuis pai nem mãe,
nunca os tiveste.
Amigos? Duvidas de todos, desconfias até das mãos que procuram te amparar no ocaso da noite.
Não queres piedade nem te moves a rogo;
não ouves súplicas de mães enternecidas,
não deixas que te seduzam nereidas da vida em terra.
És duro como a alma de Medéia,
frio como o punhal de Brutus.
Mas não és mau, nem traiçoeiro.
Não choras, não lamentas
qualquer que seja a perda.
Desprezas as vicissitudes,
caminhas sobre as cinzas da hipocrisia.
Tantos e tantos séculos se passaram
e lá está teu corpo inerte,
qual fantasma ensandecido,
a farejar um lugar que seja teu, só teu,
neste mar de escravos sorridentes.
Legaram-te a eternidade,
que nada mais é do que a montanha árida e cinzenta,
calçada com pedras pontiagudas que te sangram os pés.
Galga-a. É teu único desejo.
No mais alto ponto, orgulhoso e solitário,
talvez descubras o que sentia
esse deus quando te fez.