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Ok?

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Como Num Filme - III

- Seu Fonseca?! O senhor por aqui?
- Surpreso?
- Não, não... E com uma arma? Pra que isso, seu Fonseca?
- Calma, rapaz... É de brinquedo, veja. Vou dar de presente pro meu sobrinho, ficou com medo?
- Não, quê isso... Foi só a surpresa mesmo.
- Ah, bom... Você deve saber o que me traz aqui, não é?
- Mais ou menos.
- Mais ou menos? Como mais ou menos?
- Mais ou menos, mais ou menos, ué... Mais pra mais do que pra menos.
- Ah, bom... Selma falou consigo? 
- Falou, dona Selma falou sim.
- Então... Se falou, você já está sabendo de tudo, rapaz.
- Tudo o que, seu Fonseca?
- Sobre aquele texto que você mandou pra editora, Samuel, onde é que você tá com a cabeça, rapaz?
- Ah... Tem razão, tô meio confuso hoje.
- Tá confuso hoje e também quando escreveu o texto, não é que esteja ruim, entendeu? Mas vai ter que mudar umas coisas, vai ter que mudar...
- Vou mudar sim... Vou mudar o quê?
- Vamos com calma, não quero parecer dono da verdade.
- O senhor, seu Fonseca? Logo o senhor?!
- Por que "logo eu"?
- Nada... É só o modo de falar, o senhor que sempre foi tão, tão, tão...
- Entendi, tão educado e gentil, é isso?
- Pode ser.
- Tá certo, mas vou te falar a verdade nua e crua.
- Ai, ai, ai...
- Não entendo nada de literatura, nem de livros...
- Ah, tá... Nem eu, seu Fonseca.
- Pra te dizer a verdade, não entendo nem gosto. Prefiro filmes, principalmente aqueles que passam de madrugada...
- Ai
- Que que foi?
- A cotovelada que o senhor me deu nas costelas... Uhhh...
- Deixa de frescura, foi só um toquezinho de nada. Mas como eu ia te dizendo, Sam, posso te chamar de Sam? 
- Pode, seu Fonseca, chama do que o senhor quiser, mas chega de toquezinhos iguais a esse, tá bom?
- Hahaha... Você é engraçado, rapaz. Devia escrever pra televisão, aí sim ia ganhar muito dinheiro. Por falar em money, o fato é que tive que fazer um aporte de capital na editora, entendeu? Se não fizesse, ia tudo pro buraco. 
- Inclusive a dona Selma...
- Como disse?
- Nada... esquece, não disse nada.
- Pois então, não entendo nada de literatura nem de livros, mas quero meu rico dinheirinho de volta. 
- Por essas e por outras é que está querendo que eu mude o texto?
- Na mosca, rapaz. 
- Pode ser mais explícito, seu Fonseca? Leu meu texto todo?
- Uns pedaços, achei meio chatinho, entendeu? Não tenho o hábito de ler, mas sei quando a coisa vende ou não vende.
- E do jeito que está não vende?
- Vou ser sincero, novamente, contigo: fiz umas pesquisas, andei sondando, entendeu?
- Não.
- Mostrei teu texto para algumas pessoas e perguntei o que elas achavam. A maioria gostou, mas não a ponto de comprar o livro, entende? A opinião mais interessante foi de um cara lá da corretora.
- Que corretora? Que cara?
- A corretora é a minha, porra... Vai dizer que não sabe que eu tenho uma corretora na bolsa de valores? 
- Sabia não.
- Pois é... Esse cara é um sujeito que gosta de ler, já leu um monte de livros, até esse tal de Saramago ele já leu, por isso que eu pedi sua opinião. 
- E que nota que ele me deu?
- Seis e meio.
- Seis e meio?!
- É... Ele é um cara muito rigoroso, mas disse que você tem futuro. 
- Ainda bem, essa é a parte boa, o meu futuro.
- O diabo é que eu e Selma estamos na maior contradição.
- Ah, é?
- Sim, por que a surpresa? Contradição não quer dizer desavença, rapaz. Contradição é quando o dólar sobe e a bolsa também; desavença é quando tudo cai... ahahahaha
- Boa essa, seu Fonseca, muito boa.
- Para de puxar meu saco só porque eu sou o novo dono da editora.
- Pensei que o senhor fosse sócio de dona Selma.
- No papel, só no papel... Na verdade, quem manda sou eu. Lá em casa sempre foi assim. Mas, como eu estava lhe dizendo, o problema é que Selminha gosta de ver as coisas do lado feminista, fica dizendo que mulher é que lê, que mulher faz isso, faz aquilo...
- E faz mesmo...
- O quê? Faz o que, rapaz?
- Eu sei lá, seu Fonseca... O senhor é que falou que mulher faz isso, faz aquilo.
- Eu tava te explicando o que Selma fala a respeito de literatura, mas você hoje tá com a cabeça meio fora de órbita, acho melhor voltar outra hora.
- Também acho, seu Fonseca... Outra hora é melhor. 
- Antes deixa eu te falar o que o Maylson sugeriu.
- Maylson? Que Maylson é esse?
- O cara da corretora, o tal que já leu até O Empinador de Papagaios.
- O Caçador de Pipas?
- É, isso aí... O Maylson acha que a tua história tá boa, mas tá meio chocha. Você deveria colocar uma trama, como ele mesmo disse, "a vingança do corno"
- ...
- O que foi? Engasgou, rapaz?
- ...
- Péra que eu te dou umas porradas nas costas e já desengasga, vem cá...
-...
- Vem cá, porra! Tá com medo de quê?
- Pronto... passou, seu Fonseca, me engasguei do nada. Vamos deixar essa conversa pra outra hora?
- Vamos... Mas vai pensando nisso que o Maylson falou: o corno trama sua vingança sem que a mulher e o amigo desconfiem, entendeu? Que tal?
- Pode ser, seu Fonseca... Pode ser... 

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